Minha razão

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Criei esse espaço para postar subjetivações subjetivantes do sujeito que sou!
Filosofia, psicologia, educação.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Fim de semestre na disciplina Psicologia Comunitária

Bom dia, comunidade!
       Vamos ao encerramento de nossa discussão sobre os temas que emergiram nas socializações. Como a turma é grande e o tempo é curto, vou aproveitar essa manhã para dar uma "aula escrita".
Sobre nossos temas sociais:
       Criança e idosos voltaram no segundo dia, reforçando um destaque a esses dois temas, pois são o começo e o final da vida e, os dois, estão demandando trabalhos sociais.
       Tivemos a presença de dois temas polêmicos: religiosidade e gênero. Passamos um pouco pela sanidade mental e física (tema relevante para a psicologia) e também pela organização social. Nossa sociedade é uma organização um tanto fragilizada que aponta carências em muitas direções. Somos um tipo de Rede onde certos núcleos retém, acumulam, deixando outros núcleos desprovidos. Esse acúmulo é de conhecimento, recursos, estratégias, tudo aquilo que pode circular por uma Rede humana. Como a Rede se faz de trocas, acumular desarmonizadamente não é interessante para a Rede como um todo.
       O tema da religião/espiritualidade precisa ser compreendido por um psicólogo comunitário da seguinte maneira: religiosidade não é o mesmo que espiritualidade e cada pessoa tem o direito de escolher sua via espiritual. Na psicologia defendemos a liberdade e o respeito em torno a este tema. E alertamos que é na religiosidade que a coisa se torna "separação entre os humanos", por conta da diversidade possível e da construção do limite que cada religião faz entre o verdadeiro e o falso. Tememos as lideranças opressoras e mentirosas. Defendemos a conscientização do tema como um elemento cultural, arquetípico, ancestral, cheio de simbolismos conscientes e inconscientes. Saber pilotar por esse tema tão rico em códigos é uma destreza importante de ser adquirida, pois assim transitamos bem por todas as matrizes religiosas que cruzarem nosso caminho de trabalho profissional.
       Fico feliz que, pela primeira vez nesse trabalho um grupo trouxe o tema da matriz religiosa africana, muito cheia de preconceitos e desconhecimentos em torno dela. É importante conhecermos os contrapontos dos mundos fechados que transitamos. Comunidades de matriz católica ou protestante aparecem fácil. As marginalizadas são mais invisíveis e protegidas, pois já sofreram muita discriminação. Existem as movimentos espíritas também, que muitas vezes caem num assistencialismo traiçoeiro. E temos as matrizes orientais, que também são possibilidades culturais de relacionamento com o imaterial.
       A psicologia precisa trabalhar pela construção de uma sociedade harmônica, que integre o imaterial e o material na mesma dimensão de respeito e igualdade de direitos. Não importa a matriz cultural religiosa, importa o sentido de conscientização e de emergência de sujeitos.
       O tema dos gêneros e das relações entre eles precisa ser compreendido por um psicólogo comunitário da seguinte maneira: falar em humano é falar em uma possibilidade de múltiplas manifestações. Quando uma criança nasce não está determinado o que ela será em termos de humano. Vai depender de todas as circunstâncias e vicissitudes que encontrar pelo seu caminhar na vida. Precisamos desenvolver o respeito por cada um, sendo cada um como um possível. Aqui entra o tema da violência e do afeto. Esse jogo de atração e repulsão nos dinamiza tanto, que muitas vezes perdemos a capacidade de pilotar nosso existir. Assim, vamos resolvendo esse jogo da maneira que conseguimos. E fazemos nossas opções por amar e por rejeitar ao longo de nossas vidas.
       Para tratarmos esses temas com coerência, precisamos ir um pouco mais além, pois aqui precisamos falar de "matriz cultural" - nossa matriz cultural é patriarcal, masculina, branca, elitizada e dominadora. Isso é simbolizado no Europeu que aqui chegou e encontrou Nativos (não brancos, não elitizados, com outros diálogos possíveis entre o "masculino" e o "feminino") e trouxe Negros (com outros simbolismos constituídos), subordinando-os. E aqui fez-se uma miscigenação.
       O brasileiro é um produto de uma mistura de diversos genes, credos, códigos e modos, que faz com que nós sejamos muito mais do que qualquer uma daquelas outras matrizes anteriores (branco, índio e negro). Assim, precisamos compreender que nessa matriz muitas coisas tidas como "verdade de maioria", podem não ser a verdade, pois temos uma parte do grupo que se fez dominante, criminalizando o que não fosse "oficial". Nessa criminalização e marginalização entra a forte matriz vinda da Europa medieval, das cortes, da Igreja e das doutrinações, que trabalhou na imposição de uma crença por meio do medo e da violência. Assim, nosso Brasil ficou muito cristão-europeu e perdeu de vista outras matrizes que lhe são importantes. Perdemos a relação com a natureza, tal como tinham os índios; e a relação com as divindades naturais, tal como tinham os negros. Nossa cultura foi forjada no domínio do modelo Europeu em termos de códigos e, desde depois da segunda guerra, esse trabalho de dominação cultural seguiu perpetuado pelos Estados Unidos, colonizando o Brasil, impondo seu modelo e dificultando a percepção das múltiplas matrizes culturais humanas que aqui temos. O dominador faz um trabalho de construção de uma monocultura, excluindo as diversidades. Por isso precisamos conscientizar as pessoas desse jogo perigoso. Temos que ajudar as múltiplas matrizes culturais a se manifestarem em suas comunidades de base. Temos que conseguir construir diálogos.
       Nesse trabalho de conscientização entra o respeito aos excluídos da grande matriz: os negros, pobres, analfabetos, camponeses, nativos, as santerias, as mulheres e suas ervas, seus saberes, seus ciclos, tão inconstantes e diferentes do homem racional, previsível e mecanicamente ritmado. Essa matriz racional e mecanicamente ritmada constrói, também, o sentido de sanidade e de loucura - campo onde temos que atuar.
       Aqui ressalto a ampla constatação de todos os grupos, que o problema, muitas vezes está em singularidades que se sentem apartadas do todo. Pessoas com dificuldades de relação, de compreensão do trabalho em grupo, interesses confusos, ganhos secundários, etc. Nosso trabalho seria o de sensibilização para a importância de um trabalho de desenvolvimento pessoal. Saber quem sou eu para ter consciência de qual lugar social eu ocupo. E assim, ajudarmos ao todo.
       Na dialética da hegemonia e da contra-hegemonia a humanidade vai construindo sua história com os diferentes, tentando harmonizar sua caminhada entre tantas desarmonias. Precisamos desconstruir muitos mitos criados para sermos boas psicólogas e bons psicólogos e conseguir ajudar nossa sociedade a respeitar as diferenças, compreender as opções, lutar por uma sociedade mais instruída e responsabilizada por si mesma. Quando colocamos a responsabilidade de nossa vida fora, ficamos caminhando, caminhando e nunca encontraremos resolução. Levantando um princípio mais autopoiético, quem sabe, emergirão mais sujeitos ecológicos nas nossas redes humanas.
Espero que o curso de psicologia social comunitária ajude a instalar essa matriz ética em cada um de vocês! Precisamos de psicólogxs comprometidxs com o todo do humano!

Abraços!!
Grata ao trabalho de grupo que conseguimos!!
Profa. Ana
Texto publicado à turma de Psicologia Comunitária do IESB Oeste, escrito na manhã de 06/06/2016, Brasília-DF.

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